quinta-feira, 7 de abril de 2011

Jantar da Primária

    No dia um de Abril de dois mil e onze, pelas nove horas, realizou-se em Chez qualquer-coisa uma reunião presidida por Fátima e com a presença de parte da turma de 1993 do EML e com a seguinte ordem de trabalhos.

    É certo que se tratava dos anos do Zé Gato, mas a realidade é que eu já tinha prometido que ia a este jantar. Mas que vinha a ser este jantar? Tratou-se da segunda reunião dos alunos da turma de 1993 do EML, isto é, um jantar da primária e pré-primária, com presença das professoras e tudo. De facto, este era o nosso segundo jantar com este tema, e o primeiro foi estranhamente divertido. Acabámos no miradouro do Bairro Alto a fumar ganzas, com um grupo dividido e eu - no meu belíssimo Dear Celine - no meio a tentar compreender. A solidão da juventude manteve-se nesse momento. Desta vez, no entanto, fomos menos pessoas. Mas, como novidade, apareceu a Francisquinha. Eu neste dia levava a minha saia de cogumelos, que levou a um freak malabarista me gritar "COGUMELOS MÁGICOS PARA TI!! <3". Devo dizer que me sentia extraordinariamente bem, como costuma acontecer cada vez que levo um saiote. Já tinha estado a passear, e a ler "O Templo Dourado" de Yukio Mishima, na Baixa e no Chiado - mas não limitada à estação de metro - porque a minha aula acabou às seis e meia e eu estava convencida que o jantar era às oito.

    O jantar compôs-se de um belíssimo bife e vinho e sangria, o que era mesmo necessário devido ao preço abusivo do menu (18 euros, eu pessoalmente esperava que os pratos fossem todos feitos de ouro) Fiquei entre a Inês Chora e o Francisco Morais (peço perdão por colocar estes nomes, mas estes são os nomes pelos quais eram conhecidos na primária e, de certa forma, funcionam como pseudónimos, porque agora já ninguém is chama assim), com a Bia (a educadora de infância) à minha frente.

    E assim falámos de diversos assuntos:

    - De como eu e a Margarida Belo ostracizávamos a Margarida Martins, não a deixando subir àárvore maior (que tinha dois lugares para sentar, três com algum talento, mas a terceira pessoa ficaria sempre afastada), justificando que nós éramos esquilos e ela era um urso.
    - De como eu rugia e arranhava as pessoas como um jaguar, porque pensava que era um.
    - De como o vão da escada era um lugar dificílimo de obter e, quando o obtíamos, diziamos sempre "está ocupado", apesar de ser nojento e de cheirar a urina.
    - De como a Filipa Fiadeiro partiu um pé a descer do beiral de uma janela, sem sequer cair. Ela apenas pousou o pé no chão e subitamente não conseguia andar.
    - De como a Marta Smith tinha os pais divorciados e a Inês Chora escreveu uma carta para o tribunal.
    - Da nossa peça de teatro sobre o D. Dinis, que era toda em verso, da qual o Matias fazia parte como Bobo número 2 (dava jeito ter dois bobos para rimar)
    - Das nossas aulas, das quais lembramos apenas fazer teatrinhos com as cassetes da Disney como som de fundo. Eu era sempre um animal, e lembro-me de ser a Nana - cão da família Smith em Peter Pan - e de ser um esquilo aleatório em A Bela Adormecida.
    - Do primeiro teste em que tive Suficiente Mais, onde pintei a cara de um palhaço.
    - Da maior vergonha da minha vida, que consistiu em puxar os collants quando estava com um vestido de flanela verde, e toda a gente viu as minhas cuecas. A sala estava toda em silêncio, começaram todos a rir, eu ainda tentei aguentar mas não resisti começar a chorar.
    - De como eu chorava por qualquer razão.
    - De quando eu encontrei um passarinho caído no chão e a Fátima (professora da primária) pensava que ele estava morto e depois o Pedro Serrasqueiro meteu-lhe um pauzinho debaixo da asa, puxou-o e ele voou. Depois disso fiquei convencida de que o passarinho vinha todos os dias para a minha árvore (a tal grande dos três lugares. Por vezes só conseguíamos outra que só tinha dois) cantar para mim.
    - De como a Lara Bule não nos deixava jogar ao elástico.
    - De quando o meu poema nao foi escolhido para ser a música da Menina do Mar, que citava: A menina do mar/Com seu ar fofinho/Mergulhou no mar/Muito devagarinho/No mar havia sereias, anémonas e raias/O resto não me lembro
    - De como as nossas mesas do refeitório eram octogonais e tinham quatro lugares.
    - De como o Gonçalo Baptista tinha uma lista de alergias ao lado do lugar dele, porque era alérgico a tudo.
    - De como eu uma vez ia mascarada de leopardo no Carnaval e tinha uma máscara lindíssima cheia de jóias, com a qual não conseguia ver nada. A Fátima avisara-me, mas eu mantive-a e consequentemente caí, ao que procedi a chorar. Depois fomos ao cinema Turim ver o Todos os Cães Merecem o Céu, filme que dizem termos visto milhentas vezes na ludoteca. Mas eu não me lembro de ver filmes na ludoteca, lembro-me simplesmente de estar na ludoteca sem fazer nada.
    - De quando a Fátima puxou o Tiago Brissos pelas pernas e ele se agarrou às mesas a berrar "A Lili não! A Lili não!", e levou várias mesas pelo corredor afora até à sala da Lili, megera e professora da terceira classe. Isto traumatizou-nos a todos profundamente.

    Depois contei à Fátima que escrevo histórias sobre peixes para crianças, e fiquei de lhas mandar. Também falámos de animais, porque eu agora percebo deles, e do estado da nação, do qual me orgulho de não saber absolutamente nada além de que BRIC significa Brasil, Rússia, Índia e China. No intervalo para cigarro descobri que o Matias esteve no Boom e que agora vai para lá ajudar a construí-lo. O Bruno Ricardo deu-nos uma fita para escrever e eu desenhei um gato e disse que gostava dele na infantil, mas eu só sei disso porque os meus pais me contaram, eu cá não me lembro de nada disso. Lembro-me que pensavam que eu tinha medo das escadas, quando não tinha (evidentemente). Também não me lembro de alguma vez termos tido um periquito na Sala Rosa, mas aparentemente tivemos um que se casou com o periquito da Sala Amarela.

    Entretanto, o restaurante fechou e mandaram-nos embora. Dispersámos e eu, Francisco Morais e  Fátima seguimos para o Bairro Alto. Imediatamente, confrontada com a quantidade massiva de gente que lá estava, Fátima desistiu da ideia de se encontrar com a sua outra turma, que estava a fazer um jantar na mesma área nesse mesmo dia, e desceu.

    Por isso fui com o Francisco Morais para o Bairro, encontrando uns colegas dele pelo caminho e conhecendo uns amigos dos colegas dele. Falei-lhes de drogas pesadas e de castração de gatos. Depois apanhámos os dois um táxi, porque ele ainda mora ao pé da escola e eu moro um bocado mais para a frente e falámos de como tinham sido dos melhores anos das nossas vidas e sobre o Esquadrão Classe A, do qual não me lembro absolutamente nada.

    E, nada mais havendo a tratar, foi lavrada a presente acta que, depois de lida e aprovada, vai ser assinada pelo presidente e por mim, a Amiga Imaginária, na qualidade de secretária, que a redigi.

1 comentário:

  1. Carolina, é o Francisco. O texto está muito engraçado, vou partilhá-lo com os outros!

    Beijos :)

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